sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Mãos à obra

Quando pensei em remodelar o jardim, já tinha uma ideia relativamente definida sobre o resultado final que pretendia. Ainda assim pareceu-me importante pensar duas vezes antes de partir para a prática porque, afinal de contas, as plantas podem mudar mas a estrutura é o elemento permanente do jardim. 

Porém, para quem tem algumas dificuldades em obter inspiração, visitar outros jardins ou até mesmo fazer uma simples pesquisa de fotografias na internet acaba por ser uma preciosa ajuda no que toca à clarificação de ideias.   

É claro que no final, a forma do jardim, as plantas introduzidas e os materiais utilizados reflectem o meu gosto pessoal. Os jardins devem ser encarados como uma extensão de nós próprios e, tal como dizia Gertrude Jekyll, a mais influente designer de jardins de todo o século XX em Inglaterra, os jardins devem ser encarados e cuidados como uma divisão da própria casa.  

Pessoalmente, sempre me identifiquei com jardins com um aspecto mais natural e informal e onde a utilização de materiais naturais, como pedra ou madeira, permitem criar aquele ambiente mais campestre e rústico. Ao mesmo tempo, sempre tive uma certa propensão para apreciar as flores do campo ou até mesmo aquelas mais discretas e às quais pouca gente dedicaria muita atenção. 

Um dos desafios colocados pelo meu jardim era a pequena dimensão. Por isso tentei desenhar o jardim de forma a dar-me a ilusão de que era grande. E fi-lo seguindo três ideias:

- Criei caminhos labirínticos e com muitas curvas de forma a fazer-me pensar que teria de andar mais para chegar a um determinado espaço. 

- Outra coisa que fiz foi dividir o jardim em pequenos espaços de forma a criar vários mini-jardins. Essa mesma divisão foi aplicada aos canteiros de forma a ter pequenos cantinhos. 

- Por último, optei por escolher flores com alguma dimensão e altura de forma a esconderem o que está atrás delas. Isso cria a sensação de mistério e a ideia de que ainda há mais para ver para além daquilo que está à nossa frente. No fundo, a ideia é não permitir a visualização completa do jardim no momento em que se entra nele. 


Esquema do jardim
Esta estrutura tinha igualmente um lado prático. Uma das preocupações que tive logo no início foi garantir que o novo jardim não exigia uma elevada manutenção. Não era minha intenção cavar repetidamente a terra antes de qualquer sementeira ou plantação como habitualmente se faz, especialmente porque isso pode ter impactos negativos para a preservação da vida do solo. 

Por isso, criei camas de cultivo permanentes de pequena dimensão e separadas dos caminhos por uma bordadura de canas entrançadas. Assim, eu podia cuidar das plantas sem na realidade ter de pisar o solo. Hoje, a única coisa de que necessito para fazer uma plantação ou sementeira é a minha pequena pá de jardim. Para além disso, todos os caminhos são cobertos anualmente como uma espessa camada de folhas. Isso evita o alagamento dos caminhos e o nascimento de ervas daninhas. 

Naturalmente toda esta estrutura foi feita de acordo com o meu gosto pessoal. Queria mesmo que o jardim tivesse um ar descontraído, campestre e rústico. Por isso tentei inspirar-me nos tradicionais cottage gardens britânicos e nos jardins monásticos do período medieval. 

Assim, todos os canteiros foram limitados por bordaduras de canas (que actualmente estou a substituir por varas de madeira), utilizei pedras para fazer um pequeno socalco para nivelar o jardim, utilizei estacas de madeira para fazer as separações entre as flores e os legumes de forma a criar pequenos cantinhos, comprei alguns vasos de terracota com um ar mais rústico e optei por escolher objectos decorativos com um aspecto mais antigo e tradicional.    






   
A construir vedações de madeira para a criação de pequenos espaços

Uma das bordaduras já concluídas com varas de dióspireiro e lodoeiro
O caminho já com a cobertura de folhas
Por fim, faltavam as plantas. Importava que esta escolha privilegiasse plantas que fossem simultaneamente atraentes para a vida selvagem, de fácil adaptação às condições existentes e que dessem aquele ar campestre e informal. Durante o auge do jardim, no final de Maio e início de Junho, tornou-se habitual estar no jardim entre abelhas, borboletas e muitos outros insectos.

Flores simples com uma única fila de pétalas são irresistíveis para os insectos polinizadores


Em relação aos legumes, nada melhor que optar pelas antigas variedades, hoje quase desaparecidas, mas que deixam qualquer legume de supermercado a um canto. 

Quanto às flores, bem... a escolha é quase infinita. O difícil mesmo é resistir a todas elas. Para além das flores selvagens que existem aqui na zona, optei por tentar encontrar plantas de outras regiões do mundo que partilham um clima semelhante ao nosso. Juntamente com a bacia do Mediterrâneo, é o caso do Chile, da África do Sul, da Califórnia e de algumas regiões da Austrália. Destas regiões e países vêem plantas como os pelargónios (sardinheiras), as gazânias, os gladíolos ou as papoilas da Califórnia. 

Por último, à semelhança daquilo que é prática nos jardins de campo britânicos, a intenção era misturar legumes e flores de forma harmoniosa.  Não por mero cliché mas porque existem benefícios para as plantas e para a generalidade do jardim. Eis aqui alguns exemplos:

Uma couve lombarda "Pé alto de Lisboa" entre crisântemos tricolores, calêndulas e ervilhas de cheiro


O feijão verde e o alho francês entre várias flores
Hoje, um ano depois desde o início da reformulação do jardim, a estrutura está finalmente quase terminada. O esforço continua a ser significativo, mas não reparo nisso. Quanto mais me apaixono pela jardinagem, mais me apercebo que a verdadeira recompensa está no processo e não no resultado final. Porque é no processo que se cria intimidade com as plantas, com o solo, com toda a vida que existe no jardim. Ser jardineiro não é uma profissão. É um modo de vida. E que belo que é...

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